O RISCO CALCULADO
A vida de artista é um risco.
De repente a tinta vaza, o risco entorta e a idéia foge.
Ou então o risco sai perfeito, limpo, reto, o traçado da razão
pura – e aí vem um passarinho e pousa em cima.
Um perigo.
Caulos é o maior exemplo do risco calculado que eu conheço.
Não há o perigo do seu risco borrar ou da sua idéia perder o rumo.
Ele sabe exatamente o que quer e como chegar, meticulosamente, lá.
Por linhas certas.
Mas quando você pensa que chegou ao fim da linha e o desenho
terminou, aí é que ele começa. Vem um passarinho e
pousa em cima.
sabe aquele cara que parece estar, polidamente, ajudando a
velhinha a atravessar a rua e na verdade
a está sequestrando? É o Caulos.
As suas linhas puras são uma armadilha. Caulos, o cartunista-aranha.
Primeiro você é atraido pela beleza do desenho e das cores.
Depois ri da piada. Depois sacode a cabeça com a engenhosidade
de tudo. E então começa o fascínio. (Isto é um sequestro!)
Um quadro do Caulos a gente não vê. A gente vai vendo.
Quando vê está lá dentro.
E aí o risco é todo nosso.
Luis Fernando Veríssimo – setembro de 1977.